terça-feira, junho 14, 2005

Tosca encenação, actores mediocres


Primeiro acto: José Sócrates, como secretário-geral do PS, promete, durante a campanha eleitoral, não aumentar os impostos. É apenas uma de muitas outras promessas.
Os portugueses confiam nele e dão-lhe uma inequívoca maioria absoluta. O novo primeiro-ministro tem, pois, todas as condições para implementar o seu programa de Governo.

Mas, eis senão quando, chega um novo actor. Seu nome: Vítor Constâncio; sua função: governador do Banco de Portugal. Há vários anos que o é, mas, pelos vistos, tem andado distraído. Só agora descobriu que a crise que o País atravessa é muito grave. Tão grave que teve de ir a correr legitimá-la junto do Presidente da República.

Estava montada a encenação. Em apenas dois meses, a crise passou de controlada a muito grave. O primeiro-ministro passava a ter toda a legitimidade para dar o dito por não dito e, ao contrario do que prometera, aumentar mesmo os impostos. Só não se percebe bem o papel que o governador do Banco de Portugal andou a desempenhar nestes últimos meses, dando, primeiro, indicação de uma certa estabilidade, para, de repente, surgir a apontar sucessivos agravamentos e, bem cedo, afirmar que era necessário aumentar os impostos sobre o automobilista...claro! Situação à qual o ACP, de imediato, reagiu, como, aliás, se impunha.

O Dr. Vitor Constâncio, há dois ou três meses atrás, não conhecia esta situação para aconselhar José Sócrates a não fazer promessas que não podia cumprir? Quem é que querem enganar?
Segundo acto: numa comunicação ao País, via Assembleia da República, o primeiro-ministro anuncia um aumento de impostos. Deixem-me adivinhar: sobre os combustíveis, sobre os automóveis e sobre os automobilistas. Acertei! Não foi difícil: a receita é sempre a mesma. Mas, vamos lá ver se consigo entender. Então, se o défice orçamental é ocasionado pelas imensas despesas do sector público, porque é que não se corta a fundo nessas despesas? Porque é que quando se toca neste assunto, os responsáveis deste País começam todos a "assobiar para o ar" e a apontar o dedo para outras direcções? A resposta é simples: são todos politicamente "cobardes" a não têm coragem, nem vontade politica para resolver o problema de uma vez. Mas, diga-se em abono da verdade, que esta "cobardia" política não é exclusiva do partido actualmente no governo, mas de todos os partidos que por lá passaram nestes últimos trinta anos.
Feitas as contas, o que é que vai mudar para o automobilista português?
Em primeiro lugar, o aumento do IVA para 21% significa que tudo o que está relacionado com o automóvel vai sofrer um acréscimo de preço considerável, a começar pelo próprio automóvel. É bom não esquecer da perfeita "ilegalidade", a nível europeu, que já é ter um imposto sobre outro imposto, neste caso IVA sobre IA (Imposto Automóvel). Mas, a abrangência de aplicação do IVA vai estender esse aumento a produtos tão diversos como uma simples lavagem do automóvel ou um produto tão fundamental para a segurança, como os pneus.
Não contente com a situação, o governo aumenta também os combustíveis e...duplamente. É agravado o ISP em 5%, mas como o IVA também aumentou, temos um redobrado agravamento. Aumentar os combustíveis significa, de imediato ou a curto prazo, aumentar o dia a dia do cidadão. E, até ver, o automobilista também é cidadão. Vão aumentar os transportes e, por via disso, o pão, o leite, os medicamentos a todos os produtos vitais às nossas vidas.
O sector automóvel na sua globalidade e o automobilista em particular, foram constituídos, pelos sucessivos (des)governos deste País, como alvos privilegiados para compensar o despesismo exacerbado de um Estado que não se sabe controlar a si próprio e a única solução objectiva a concreta que tem vem desde a época medieval, ou até mesmo antes: aumentar impostos. Diz o primeiro-ministro que se recusa a realizar receitas extraordinárias. Mas o que são os aumentos de impostos senão receitas extraordinárias? Chega de tanta demagogia. Arregacem as mangas, trabalhem, dêem o exemplo e ponham este País a produzir. Criem riqueza e não despesas! E, já agora, mudem de encenação e ensaiem melhor a peça!
José Vieira In Revista ACP Junho de 2005