Veio agora, avulsamente, José Sócrates anunciar algumas medidas para descongestionar a Justiça, a qual, tudo o indica, estava em vias de ter um enfarte ou uma paralisação cerebral. Tão essencial como essas medidas, seria importante cuidar das causas do estado de saúde da senhora Justiça, embora Roma e Pavia não se tenham feito num dia. A conflitualidade que existe entre os portugueses não é virgem. A Banca, o verdadeiro patrão dos portugueses, por exemplo, é um dos maiores responsáveis pelo entupimento dos tribunais. As rendas foram congeladas, ilegalmente, e os senhorios foram substituidos pela Banca, que cobra chorudas “prestações”, absorvendo a totalidade do rendimento disponível das famílias, e leva à crise endémica que o país vive há longos anos.
As disposições agora anunciadas, se bem percebi o que “a minha” televisão me mostrou, estavam no bolso do Aguiar Branco, e que as deixou esquecidas nalgum banco do Parlamento e foram apanhadas pelo Alberto Costa. Interessa então ver se as medidas propostas pelo Alberto Costa têm o tamanho dum ratinho ou duma montanha:
- Férias judiciais. Se as pessoas têm apenas 22 dias úteis de férias, não há a mínima razão para estar escrito no papel que têm 60 dias, e muito menos para que se faça tanto barulho com uma “regalia” que não tem aplicação prática. Sem procuração bastante, e sem manteiga, penso que Alberto Costa não há-de ser burro que tenha querido ofender qualquer operador judiciário, ou outra classe profissional. Ademais, e sempre sem procuração, se, como “represália”, vão passar a cumprir, como de direito, o horário legal, porque as férias vão ser reduzidas para 30 dias, fica-se com a sensação de que havia uma compensação do trabalho suplementar por 30 dias de férias, ou então que as férias eram mesmo de 60 dias...
- Cheques baratinhos de 30 contos. Em concreto, o resultado será nulo, ou seja desvia-se o processo para os tribunais cíveis, o que acaba por estar correcto. Todavia, a questão de fundo, a descriminalização do cheque ficou dentro da gaveta. De facto, tem-se dificuldade em perceber onde se foi buscar a ideia de que o cheque só é válido se tiver um polícia atrás. É evidente que, despenalizado o cheque, deixa de ser obrigatória a sua aceitação, mas continua a ser um meio válido de pagamento. Suponho que ninguém defenda, perdendo os cheques a protecção da “gnr”, temos de passar a andar com uma sacola de notas às costas. Concerteza que deixa de ser irmão da moeda corrente, e passa a ser meio-irmão da letra e da livrança. Acresce que o cheque, as mais das vezes, é pura chantagem do comerciante.
- Contra-ordenações. A acção é falsa. Todas as contra-ordenações têm recurso para o Tribunal, e logo os processos não morrem nas mãos da Autoridade Administrativa, salvo se a intenção for, de facto, acabar com a Justiça...
- Injunções. Esta medida também não é verdadeira, e valem aqui as razões referidas quanto às contra-ordenações. Um processo de injunção é sempre discutido no Tribunal independentemente do seu valor.
- Renovação automática do seguro. Como se sabe, todos os seis meses, ou anualmente, as Seguradoras mandam uma simpática factura da renovação automática do contrato de seguro. Enquanto não houver um acidente no ano, o povão, esperto, vai dizer que se trata duma renovação automática e logo não paga o prémio do seguro. As seguradoras vão ficar com o rabinho de fora, e vamos ter graves problemas com a responsabilidade civil. Esta medida vai trazer consequências terríveis para segurança rodoviária portuguesa, e terá que ser rapidamente anulada.
- Tribunal da residência do consumidor. Paga o justo pelo pecador. Por causa das seguradoras, e dos bancos, agora o cidadão cumpridor tem de ir à procura do caloteiro. A medida tem cabimento quanto à distribuição do trabalho, mas, como disse, penaliza os justos, os credores “ocasionais”. Esta medida é mais uma facada na liberdade contratual, mas isso é o que não falta no nosso ordenamento jurídico, i.e. direito das favelas, leia-se do trabalho, da família, do inquilinato, dos processos-crime “semi-públicos”, desenhados para interditos por anomalia psíquica.
Convém ter presente que as "normas imperativas" são ditadas pelos moços, alguns toscos, que estão empregados no Parlamento, e não caem do céu, nem são transportadas no bico de uma cegonha. Cabe precisamente aos advogados lutarem contra as pretensas normas imperativas que estão muito próximas, ou se confundem com o abuso do poder. Sendo doutra forma temos de substituir os advogados por carneiros, e talvez haja alguma vantagem nisso, pelo menos, quiçá, na lã que os primeiros não produzem...
Concluindo, estamos perante um ratinho! Penso, todavia, que José Sócrates, embora as providências sejam pobres, não falou como um demagogo. Como disse, Alberto Costa passou-lhe os papéis do Águiar Branco, e o homem aproveitou-os para deixar o Marques Mendes com a chave na mão. Dando outra na ferradura, embora tenha saido um ratinho à rua, um dia, quiçá, pode transformar-se num elefante, ou numa montanha. Afinal, é melhor ter um rato do que uma mancheia de papéis guardados no bolso para os ratos roerem.
Gil Teixeira
As disposições agora anunciadas, se bem percebi o que “a minha” televisão me mostrou, estavam no bolso do Aguiar Branco, e que as deixou esquecidas nalgum banco do Parlamento e foram apanhadas pelo Alberto Costa. Interessa então ver se as medidas propostas pelo Alberto Costa têm o tamanho dum ratinho ou duma montanha:
- Férias judiciais. Se as pessoas têm apenas 22 dias úteis de férias, não há a mínima razão para estar escrito no papel que têm 60 dias, e muito menos para que se faça tanto barulho com uma “regalia” que não tem aplicação prática. Sem procuração bastante, e sem manteiga, penso que Alberto Costa não há-de ser burro que tenha querido ofender qualquer operador judiciário, ou outra classe profissional. Ademais, e sempre sem procuração, se, como “represália”, vão passar a cumprir, como de direito, o horário legal, porque as férias vão ser reduzidas para 30 dias, fica-se com a sensação de que havia uma compensação do trabalho suplementar por 30 dias de férias, ou então que as férias eram mesmo de 60 dias...
- Cheques baratinhos de 30 contos. Em concreto, o resultado será nulo, ou seja desvia-se o processo para os tribunais cíveis, o que acaba por estar correcto. Todavia, a questão de fundo, a descriminalização do cheque ficou dentro da gaveta. De facto, tem-se dificuldade em perceber onde se foi buscar a ideia de que o cheque só é válido se tiver um polícia atrás. É evidente que, despenalizado o cheque, deixa de ser obrigatória a sua aceitação, mas continua a ser um meio válido de pagamento. Suponho que ninguém defenda, perdendo os cheques a protecção da “gnr”, temos de passar a andar com uma sacola de notas às costas. Concerteza que deixa de ser irmão da moeda corrente, e passa a ser meio-irmão da letra e da livrança. Acresce que o cheque, as mais das vezes, é pura chantagem do comerciante.
- Contra-ordenações. A acção é falsa. Todas as contra-ordenações têm recurso para o Tribunal, e logo os processos não morrem nas mãos da Autoridade Administrativa, salvo se a intenção for, de facto, acabar com a Justiça...
- Injunções. Esta medida também não é verdadeira, e valem aqui as razões referidas quanto às contra-ordenações. Um processo de injunção é sempre discutido no Tribunal independentemente do seu valor.
- Renovação automática do seguro. Como se sabe, todos os seis meses, ou anualmente, as Seguradoras mandam uma simpática factura da renovação automática do contrato de seguro. Enquanto não houver um acidente no ano, o povão, esperto, vai dizer que se trata duma renovação automática e logo não paga o prémio do seguro. As seguradoras vão ficar com o rabinho de fora, e vamos ter graves problemas com a responsabilidade civil. Esta medida vai trazer consequências terríveis para segurança rodoviária portuguesa, e terá que ser rapidamente anulada.
- Tribunal da residência do consumidor. Paga o justo pelo pecador. Por causa das seguradoras, e dos bancos, agora o cidadão cumpridor tem de ir à procura do caloteiro. A medida tem cabimento quanto à distribuição do trabalho, mas, como disse, penaliza os justos, os credores “ocasionais”. Esta medida é mais uma facada na liberdade contratual, mas isso é o que não falta no nosso ordenamento jurídico, i.e. direito das favelas, leia-se do trabalho, da família, do inquilinato, dos processos-crime “semi-públicos”, desenhados para interditos por anomalia psíquica.
Convém ter presente que as "normas imperativas" são ditadas pelos moços, alguns toscos, que estão empregados no Parlamento, e não caem do céu, nem são transportadas no bico de uma cegonha. Cabe precisamente aos advogados lutarem contra as pretensas normas imperativas que estão muito próximas, ou se confundem com o abuso do poder. Sendo doutra forma temos de substituir os advogados por carneiros, e talvez haja alguma vantagem nisso, pelo menos, quiçá, na lã que os primeiros não produzem...
Concluindo, estamos perante um ratinho! Penso, todavia, que José Sócrates, embora as providências sejam pobres, não falou como um demagogo. Como disse, Alberto Costa passou-lhe os papéis do Águiar Branco, e o homem aproveitou-os para deixar o Marques Mendes com a chave na mão. Dando outra na ferradura, embora tenha saido um ratinho à rua, um dia, quiçá, pode transformar-se num elefante, ou numa montanha. Afinal, é melhor ter um rato do que uma mancheia de papéis guardados no bolso para os ratos roerem.
Gil Teixeira